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A mostrar mensagens de julho, 2025

HOMEM DE PAPEL HIGIÉNICO

  Quando do lixo se faz arte Custa bem pouco o material Pois existe em toda a parte Com abundância sem igual.   Aquela tarde só poderia ser inolvidável pela surpresa que me aguardava. Era expetável que assim acontecesse. Na verdade, ouvia comentários dispersos, mas todas na mesma direção. Apontavam para toda uma classe de excelência nas pequenas ou grandes realizações saídas das mãos e da capacidade inventiva de Heitor. Bem gostava eu de engrossar a plêiade de admiradores, mas, como só tinha acesso aos trabalhos que expunha na escola a anunciar qualquer evento da comunidade educativa, sentia-me limitado nas minhas apreciações. Desejava e tinha a certeza que havia de chegar o dia em que teria a possibilidade de formular um juízo mais fundamentado. Fiz-lhe constar esse desejo e era desta vez que se realizava. Fora convidado para ver os seus trabalhos, mas teria de ser depois de ouvir alguns comentários abonatórios a seu respeito e de manifestar interesse em confirmar com o...

PALAVRAS

Escorrem palavras e ideias Até num corpo alucinado; Brotam da pele e das veias Do cabelo e de todo o lado. Num turbilhão que se agita Na cadência dos sentidos Nenhuma palavra é maldita Perante os espaços perdidos. Tenha sentido ou só forma, Seja para chorar ou para rir Qualquer palavra, por norma, Tem uma função a cumprir. Há palavras que são beijos Outras, lanças ou punhais, Umas alimentam os desejos Outras morrem nos jornais. Há palavras que são fogo, Outras, qual suave aragem, Há naquelas todo um jogo E nestas, culto da imagem. No reino dos sentimentos Onde o amor é mais forte São muitos os pensamentos Que vivem para lá da morte. Onde há beijos e carinhos Qualquer aroma há no ar Pois são ruas e caminhos Por onde dá gosto andar. Quero palavras de beijos Quero beijos de mil cores; Para satisfazer os desejos, Estimo ver-te sem ter dores. Júlio Rocha (18/7/2025)

HORA DE JACQUES

Fiquem lá com os louvores Que ofuscam o pensamento Pois teimo a ver as cores Onde outros veem cinzento.   - Como mudastes, Jacques – provocava-me o Álvaro, amigo do peito desde que nos cruzámos pela primeira vez, já lá vão meia dúzia de lustros. – Trazias os professores e funcionários num pé-de-vento e hoje tão calmo!... Estás um homem feito e perfeito, rapaz. - Pudera! – retorquia-lhe com roçada convicção. - A velhice tudo corrige, mas, somado a isso, era forçoso mudar qualquer coisinha com tanta gente a moer-me a paciência a toda a hora. O que tive de passar, valha-me Deus. A atitude, a linguagem, a forma de encarar as pessoas, a sociedade e o mundo alteraram e eram agora diferentes em mim. Para quem nunca fora além das epidérmicas aparências, tudo era agora genuinamente espantoso. Poucos acreditariam que daquela massa informe e bruta pudesse sair um excelente polícia, um funcionário público do melhor que ainda se fabrica, ou um licenciado que desse cartas nas barras do t...

RATOS

Como os ratos nos deixam pistas Por serem animais incontinentes Assim os incendiários oportunistas Por mais que se julguem prudentes.   Aquilo que os jornalistas teimavam em difundir como notícias deixara de o ser por uma razão clara: mais parecia que algumas reportagens exibidas à saciedade em horário nobre tinham si ali colocadas para distraírem um país que estava a banhos do que por refletirem a preocupação de encontrar soluções para a floresta. Bastava mudar de canal e o guião mantinha-se previsível, enfadonho e provocador cada vez que os ouvintes ou telespectadores tinham oportunidade de ver o telejornal. O local podia variar, mas as chamas lavravam um pouco por toda a parte e os discursos de circunstância eram sempre os mesmo com lamentos de quem perdia os seus bens e promessas sem qualquer intenção de serem cumpridas por parte das autoridades civis e militares: mais efetivos, mais meios, mais vigilância e mão pesada da justiça. Desde há uns anos a esta parte que vinha se...