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A mostrar mensagens de junho, 2025

DEIXAI-AS TODAS P'RA MIM

Quem tem olhos e barriga Maiores do que lhe convém, Seja cigarra ou formiga, Engana e engana bem.   - Tem alma de judeu. Onde lhe cheirar a lucro, aí está ele a meter a sua colherada. Nem aos irmãos lhes perdoa. Ele bem reconhece que os amigos são importantes e merecem a maior consideração fora dos negócios, mas a sua egomania cega-o. - É bem verdade que está em maré de rosas, Duarte, mas quando lhe aparece uma burra de saia, sai logo do sério a ver se lhe toca qualquer coisa – reforçava o Januário que se vira metido em algumas confusões pelo simples facto de o acompanhar. – Se contasse tudo o que sei. - Bem entendo. Enganou-te algumas vezes. - Teria de nascer sete vezes – protestou ferido nos seus brios de filho de negociantes e sempre a lidar em compras e vendas. – Cada vez que aparece um homem astuto há de aparecer logo outro mais refinado que lhe passe a perna. No caso dele também é assim. A destreza foi-lhe distribuída a ele e a muitos outros. Na minha vida lidei com...

MIRADOURO DO GAIO

Se uma mão dá e outra tira, E até fecha a porta aberta, Há de sempre uma mentira Esbarrar em coisa certa. O Miradouro do Gaio é um local tão solitário e esconso que se torna apetecível para os excessos de ternura que marcam o início dos namoros em Cabeça do Abutre. Com o rio a servir-lhes de testemunha, cada beijo trocado ali tem sabor a mosto e à pureza cristalina das águas que lhes correm aos pés e levam para bem longe todos os segredos que conspurquem esses momentos. Aquilo que foi criado para o bem também pode ser usado para o mal e o desleixo do turismo selvagem poluiu a sua pureza original, manchada com um crime hediondo há mais de trinta anos. Disso sabe quem ali vive e pouco importa a quem ali deixa que a vista se perca na imensidão do Sul por entre socalcos e verdura de vinhas e laranjais. Apenas nessa direção, pois, nas restantes, a negrura das serras calcinadas refreia a vontade de olhar. Encontrar por ali gente estranha que vem para conhecer em transe os encantos naturais...

A PARTIR DE AMANHÃ

Sem sinais de mentira na promessa, Estava determinado que começaria, Naquela segunda-feira e só nessa Porque finalmente chegara o seu dia.   A estação meteorológica da Ponta de Pé de Pato, hoje desativada, era apenas mais uma das centenas que foram criadas no primeiro quartel do século passado e manteve-se ativa até ao início deste. Nas três últimas décadas da sua útil vida longa, quem respondia por ela era o senhor José Alegre Pinheiro, um cidadão a avistar como muito próximos os setenta anos e que fazia o mesmo trabalho sem discussões e sempre nas boas graças dos superiores hierárquicos a quem recebia de tempos a tempos com honras de chefes de estado. Sim, para ele, eram figuras gradas que lhe mereciam reverência e uma mesa opípara pelo menos duas vezes por ano. Darem-lhe o prazer de aceitarem o seu convite, constava na sua memória como um subido galardão que fazia questão de ver testemunhado por um amigo do peito com lugar reservado à mesa, apesar de ter sempre muitas objeçõ...